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Diversas pessoas acreditam que o termo “parto humanizado” seja um “tipo” de parto e imaginam que ele seja um sinônimo de “parto em casa”, “parto na água” ou “parto sem analgesia”. Outras, associam o termo com a negação dos recursos tecnológicos disponíveis hoje em dia, acreditando que o “parto humanizado” seja “primitivo” e retrógrado.

Verifica-se, portanto, um grande “pré-conceito” acerca do termo, baseado no julgamento do que as pessoas PENSAM que seja o “parto humanizado”, sem que elas saibam, exatamente, o que ele quer dizer.

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Uma importante questão a ser esclarecida é que o termo “parto humanizado” não pode ser definido como um “tipo de parto”, onde alguns detalhes externos o definem como tal, como o uso da água, o local onde ele vai acontecer, a presença do acompanhante (que é uma lei nacional e deveria ser sempre cumprida) ou qualquer outra variável. O termo “parto humanizado” está relacionado, na verdade, com o tipo de assistência prestado durante o atendimento ao nascimento, ou seja, ele está relacionado com o processo do parto e não é um produto que nos é entregue pronto, de acordo com determinadas características.

E que tipo de assistência é esse?

O parto humanizado está respaldado nas atualizações segundo a medicina baseada em evidências. Ou seja, atualmente, as pesquisas e estudos realizados conseguem comprovar o que é ou não benéfico para os pacientes diante de determinadas situações.

Na área da obstetrícia, as pesquisas atuais demonstram que a maior parte dos procedimentos, intervenções e recursos que eram utilizados no parto, nas décadas passadas, podem ser prejudiciais e aumentar os riscos para mãe e bebê, causando consequências no processo fisiológico do parto e também na saúde física e emocional da mãe e do bebê, quando usados sem real necessidade.

Alguns desses procedimentos e intervenções são: a episiotomia (pique na vagina), manobra de Kristeller (movimento feito por um profissional da equipe, durante o parto, no qual ele empurra a barriga da mãe, para o bebê sair mais depressa), jejum antes e durante o parto, uso de “sorinho na veia” (ocitocina sintética), rompimento da bolsa, tricotomia (raspagem dos pelos), obrigatoriedade de parir deitada e a própria cirurgia cesariana.

É importante ressaltar, portanto, que o “parto humanizado” não nega o uso da tecnologia e dos recursos, porém, utiliza os resultados atualizados de estudos e pesquisas para que se faça uso das intervenções e procedimentos apenas quando eles serão benéficos para cada mãe/ bebê ou ambos.

Sendo assim, percebe-se que o “parto humanizado” é o mais seguro para mãe e bebê, pois está respaldado em estudos e pesquisas que determinam em quais casos essas intervenções e procedimentos no parto devem ou não ser utilizados, levando-se em conta cada caso, individualmente. Nos últimos 40/50 anos, isso não estava acontecendo, pois o uso das intervenções e procedimentos, que haviam sido criados para auxiliar em complicações ou evitar riscos, passou a ser rotineiro e fazia parte da assistência de quase todos os partos, pois seu uso auxiliava a acelerar o andamento do parto, o que otimizava o atendimento.

Entretanto, muitas complicações aconteciam devido ao uso abusivo e padronizado desses recursos e os estudos e pesquisas atuais provam essas consequências. Portanto,

O uso rotineiro desses procedimentos, que estava acontecendo nessas décadas anteriores, está sendo substituído pelo seu uso consciente e eles são utilizados apenas quando vêm para auxiliar e beneficiar determinada mãe/bebê, diminuindo os riscos. Essa “nova” forma de prestar assistência ao parto, equilibrando a fisiologia do parto com o uso dos recursos tecnológicos quando necessário, é o preceito mais importante ligado ao termo “parto humanizado”. Hoje em dia, quando esses procedimentos e intervenções são utilizados sem real necessidade, eles podem ser, inclusive, classificados como violência obstétrica, podendo a gestante recorrer à ouvidoria do hospital ou à justiça, caso se sinta lesionada ou prejudicada de alguma forma.

A confusão entre “parto humanizado” e “parto natural” 

Os estudos e pesquisas atuais demonstram que, quanto mais natural o parto, mais seguro para mãe e bebê, na maior parte dos casos. Obviamente, como já foi dito, quando há alguma intercorrência e o uso de algum (ou alguns) procedimento se torna benéfico para mãe, bebê ou ambos, esse procedimento deve ser utilizado. Mas quando não há necessidade de seu uso, as intervenções podem gerar um “efeito cascata” que pode transformar o parto em um evento mais arriscado. Por isso, costumamos ver a relação entre o “parto humanizado” e os partos que acontecem de forma mais fisiológica e natural.

Por exemplo, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), apenas 15 a 20% das gestantes apresentam algum tipo de adoecimento ou risco associado, necessitando de uma cirurgia cesariana.

Antigamente, quando os recursos tecnológicos, exames diagnósticos, intervenções e procedimentos ainda não existiam, essas mulheres morriam por falta de assistência. Há algumas décadas, as intervenções e procedimentos foram sendo criados, porém, o abuso no seu uso continuou gerando mortes e diversos outros tipos de consequência. Agora, com os avanços nos estudos e pesquisas científicas, podemos equilibrar o seu uso, utilizando-os como aliados, para auxiliar nos casos específicos de necessidade.

Portanto, o “parto humanizado” pode acontecer de maneira natural ou pode ter o uso de intervenções e procedimentos durante o seu andamento. O que faz a diferença são os motivos para o uso dessas intervenções. Quando elas são utilizadas com respaldo das evidências cientificas atualizadas, para beneficiar mãe/bebê ou ambos, o parto continua sendo “humanizado”.

O protagonismo da mulher durante o parto

Além de respaldar nas evidências científicas mais atualizadas, utilizando os recursos tecnológicos (intervenções e procedimentos) apenas quando são benéficos para mãe, bebê ou ambos, a assistência ao “parto humanizado” também entende que a gestante (parturiente), seja a verdadeira protagonista dessa ação. Afinal de contas, quem “faz” o bebê nascer, na maioria dos partos, é a mulher, a gestante que está parindo, ou seja, a mãe. Portanto, a equipe está ao seu lado para assistir a esse momento e auxiliar, apenas quando percebe alguma necessidade ou quando sua ajuda é útil e benéfica de alguma forma. Essa visão da mulher como a protagonista coloca-a em uma posição de destaque, onde ela pode e deve escolher o que prefere para passar por essa experiência de forma mais satisfatória.

A maior parte das mulheres sente muito medo do parto. Por isso, uma equipe comprometida em atender aos anseios e desejos dessa mulher, a fim de amenizar o impacto desse medo, pode fazer toda a diferença. Sendo assim, as equipes que atendem dentro dos preceitos da “humanização do parto” encorajam essa mulher a frequentar grupos de apoio ao parto para se informar, a ter uma equipe multidisciplinar de apoio para a hora do parto (sugerindo o acompanhamento de uma doula, além do acompanhante de livre escolha da mulher, quando possível) e a redigirem seus planos de parto, para poderem ter consciência crítica e entendimento na hora de fazerem suas escolhas. Obviamente, diante de qualquer situação de risco, a equipe entrará em ação, em alguns casos, tendo que passar por cima de algumas das escolhas feitas inicialmente pela mulher (gestante). Porém, esses casos são exceções e, na maioria das vezes, as escolhas feitas pela mulher podem ser respeitadas, sem problemas.

Como ainda estamos vivendo um “momento de transição” e algumas equipes ainda não estão prestando assistência dentro desse conceito do “parto humanizado”, frequentar um grupo de apoio ao parto, conversar com uma doula e fazer o seu plano de parto são, portanto, excelentes ferramentas para que a mulher fortaleça as suas escolhas e esteja consciente e segura sobre tudo o que vai vivenciar nesse processo, se tornando a protagonista desse momento.

Por que a discussão é importante?

Em todo o mundo, aproximadamente 830 mulheres morrem todos os dias em decorrência de gravidez ou por complicações relacionadas à gestação e ao parto (dado oficial da OMS – Organização Mundial de Saúde). Muitas pessoas acreditam e associam esse número aos “partos normais”, sem saber que na realidade, muitas dessas mortes acontecem em decorrência do “efeito cascata” gerado pelo uso indiscriminado das intervenções e procedimentos, que é o que chamamos de “medicalização do parto”. O abuso do uso desses recursos e seu uso rotineiro e padronizado transformou o parto em um evento mais arriscado do que ele é. Grande parte dessas mortes poderia ser prevenida utilizando-se os preceitos ligados ao termo “parto humanizado”, que vai ponderar sobre o uso ou não, de intervenções e procedimentos e utilizá-los apenas quando eles forem beneficiar cada caso.

O parto humanizado pode ser visto, portanto, como o “casamento” entre a tecnologia e a fisiologia, utilizando o melhor para cada gestante, bebê ou ambos, de acordo com as evidências científicas atualizadas e levando em conta as escolhas conscientes de cada mulher. Esse equilíbrio conquistado pelo uso ponderado das tecnologias e recursos, apenas nos casos de real necessidade, torna o parto mais seguro. Sendo assim, todo parto deveria ser “humanizado”. Nas últimas décadas, diversas intervenções e procedimentos estavam sendo utilizados de forma padrão, fazendo parte de praticamente todos os partos atendidos. Com os avanços dos estudos e pesquisas e os resultados atuais, a forma “humanizada” de assistir ao parto pretende diminuir o índice de mortalidade, ao passo que também melhora a experiência para a mulher e para o bebê, como um todo, causando impactos benéficos para a saúde física e emocional da mãe e do bebê, ao longo de suas vidas.