Deus pra cá, Deus pra lá. O goleiro Bruno falou só em Deus durante a entrevista coletiva realizada na manhã desta terça-feira, em Varginha. Mesmo Deus que não tem nada a ver com o esquartejamento de Eliza Samúdio, nem com a decisão de jogar o corpo para os cachorros.
Dar uma “segunda chance”, argumento do Boa Esporte, parece não funcionar. Afinal, esta também é uma chance de desrespeitar as mulheres torcedoras, as varginhenses, os varginhenses e todos aqueles que se lembram com asco e tristeza da morte que aconteceu em 2010. Mais do que isso: aquelas que já sofreram violência, aqueles que já viram suas mães, irmãs, filhas e amigas sofrerem. E também aqueles que nunca viram nem sentiram na pele, mas se importam. É desrespeito pra todo lado.
Logo após a Semana da Mulher, em que fizemos uma série de reportagens sobre violência doméstica, percebemos que o Boa está remando contra a maré. Cada vez mais os cidadãos percebem a urgência de se discutir o assunto, de combater as agressões, de fortalecer a rede de proteção às vítimas. Nesse contexto, o clube sulmineiro aparece nas manchetes nacionais como grande apoiador daquele que cometeu um dos crimes mais marcantes e cruéis dos últimos anos.
No país do futebol, a situação ainda tem um agravante: os jogadores são ídolos, permeiam os sonhos infantis, inspiram gerações. Craque ou não, o goleiro ainda pode ser herói dos desavisados, ícone para os alienados ou símbolo dos machistas agressores que se dão bem na vida.
As reações contrárias são maioria, o que proporciona certo alívio. Não dá para colocar o futebol à frente das mulheres mortas diariamente. Não dá para perdoar, nem o Boa, nem o Bruno. Aliás, melhor se apegar a Deus mesmo. Só ele seria grande o suficiente para perdoar tamanha maldade. Humanos que somos, escolhemos o repúdio.