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Há 131 anos era assinada a Lei Áurea, que formalmente trouxe a abolição da escravidão e coloca a princesa Isabel como protagonista na libertação dos escravos. Segundo a historiadora Ana Flávia Magalhães Pinto, 15 anos antes da abolição da escravatura no Brasil, 6 de cada 10 negros já haviam nascido livres ou haviam sido libertos e estima-se apenas 5% dos negros ainda eram escravos. Mas será que as correntes que prendiam os escravos realmente foram soltas?

Dados do IBGE e do Atlas da Violência mostram que negros ganham até R$ 1.200,00 menos que os brancos, o analfabetismo entre negros é de 10% e de brancos 4%, entre os desempregados 64% são negros contra 34% de brancos, 71% dos homicídios atingem os negros e 29% brancos, 61% da população carcerária é negra. Os números se devem ao racismo velado, porém arraigado em boa parte dos brasileiros, racismo estrutural e institucional instalado na sociedade. Apesar destes números, alguns ainda falam que “o racismo é raro no Brasil.”

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Até os dias atuais se tenta menosprezar a cultura, a história e as crenças trazidas da África, porém 519 anos de opressão não foram capazes de apagar estas influências na música com o rap, o funk, o samba, o axé, as cantigas de roda, a MPB; na culinária com a feijoada, o acarajé, o vatapá, o mungunzá, o quibebe, o cuscuz, o bobó; na literatura com Machado de Assis, Castro Alves, Nilo Peçanha, Lima Barreto, Coralina Maria de Jesus, Maria Firmina dos Reis; na religiosidade com o candomblé, o tambor de mina, a quimbanda, etc.

O Brasil tem adotado nos últimos anos ações afirmativas no intuito de diminuir esta diferença histórica entre negros e brancos e principalmente melhorar a representatividade dos negros nas universidades, no serviço público e nos cargos de liderança no Governo. Porque aos negros ainda são delegado os cargos tidos pejorativamente como subalternos, descritos nas grandes indústrias como “chão de fábrica”. Este tema sempre causou polêmica e comumente se explana que “essas medidas privilegiam pessoas menos capacitadas”. Ora, não há dados confiáveis, por exemplo, que comprovem que os cotistas possuem desempenho acadêmico inferior. Na maioria das vezes, os argumentos se sustentam no preconceito arraigado em nós.

Infelizmente, o Brasil é um país racista e sexista. Temos na presidência um representante desta expressiva parte da população. Não que todos eleitores do Bolsonaro o sejam, mas é difícil desassociar a imagem do presidente de alguém racista, até mesmo por questões familiares, uma vez que seu bisavô foi soldado do exército nazista e nada mais natural que seu pensamento tenha sido moldado sob a ideologia de uma superioridade racial branca. Ele idolatra o presidente norte-americano, que também foi eleito com um discurso de ódio  simpático à Ku Klux Klan. Ainda afirmou que seus filhos não casariam com uma negra, pois foram bem educados, noutro momento disse que as comunidades quilombolas não deveriam existir e que seus integrantes são vagabundos e os comparou a gado. Também segue o pensamento de um senhor que se intitula filósofo, entretanto apenas sustenta um discurso elitista muito antigo que tem as mesmas sustentações do nazismo e do fascismo.

Portanto, após 131 anos que a Lei Áurea foi assinada, o negro ainda é tratado como inferior, ainda é discriminado, ainda vive nas periferias, ainda ocupa funções menos expressivas, ainda precisa pedir autorização para rezar, ainda… Concluo que as correntes, ainda, não foram retiradas.

*Davison Cardoso é advogado