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Em “Fotografia e História”, o fotógrafo e pesquisador Boris Kossoy fala sobre a condição da imagem fotográfica como segunda realidade. Diz respeito à realidade de documento, fazendo da imagem fonte histórica. Embora estejamos mais próximos hoje da fotografia digital, pesquisas históricas continuarão centradas nos antigos documentos fotográficos de base química, preservados nos museus, arquivos, bibliotecas, empresas ou colecionadores particulares.

A fotografia é testemunha ocular de Poços há mais de 130 anos e preservou fragmentos importantes dessa história. Para compreender visualmente o desenvolvimento da nossa urbe, recorri ao valioso acervo do Museu Histórico e Geográfico de Poços de Caldas. São mais de oito mil imagens. Oito mil relatos. Oito mil cenas dispostas a recontar histórias. Foram registradas por vários tipos de lentes e câmeras desde o final do século XIX e sobreviveram a muitas gerações.

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Kossoy trata a fotografia como um resíduo do passado. Registro visual que reúne um inventário de informações acerca daquele preciso fragmento de tempo/espaço retratado. E a história que optei por relembrar hoje, através de imagens, é a história da cidade que cresce para o alto. Do adensamento. Maior número de pessoas por quilômetro, mais concreto, mais carros… Menos luz do sol, menos horizontes. Vamos falar sobe verticalização.

As imagens a seguir mostram uma cidade em transformação: das construções ao redor das fontes de água sulfurada, às primeiras edificações, que nunca ultrapassavam o limite das torres das igrejas.

Até que, em 1946, foi inaugurado o primeiro edifício de Poços: o Bauxita, com seus 13 pavimentos, que hoje abriga também a Câmara Municipal. Localizado na rua Junqueiras, o Bauxita foi o instigador para novas construções verticais que ainda hoje protagonizam discussões sobre o crescimento de Poços de Caldas e o resguardo do patrimônio, sobretudo natural.

Cabe lembrar que Poços de Caldas foi construída à beira de uma caldeira vulcânica e tem entre suas peculiaridades, além da água sulfurada, a Serra de São Domingos, exuberante cadeia montanhosa. A remodelação de Poços ocorrida na década de 30 (encomendada pelo então governador Antônio Carlos Ribeiro de Andrada) baseou-se na harmonização da urbe com o espaço que a circunda: uma cidade de águas situada na montanha. Foi o que relatou o arquiteto Eduardo Pederneiras, contratado para fazer de Poços uma Suíça brasileira.

No artigo “A ótica construtivista do desenvolvimento urbano e sua influência no patrimônio cultural imóvel” a arquiteta Anamaria Canuto Sales de Oliveira lança olhar sobre a forma como a especulação imobiliária nos centros de cidades que possuem caráter histórico influi na percepção espacial e prejudica a ambiência dos bens culturais imóveis. Fala, ainda, sobre como tanta interferência alterou a paisagem desses imóveis ao longo dos anos.

E se por um lado a preservação do patrimônio cultural é tida como vilã do desenvolvimento, por outro, “a permissividade construtiva em áreas contíguas ao centro interfere diretamente na ambiência dos bens culturais que outrora tinham destaque na paisagem urbana, e hoje resistem com dificuldade às investidas da especulação imobiliária”. Como exemplo, a arquiteta cita a Basílica Nossa Senhora da Saúde (igreja Matriz), que passou de protagonista à coadjuvante na paisagem, e o Condomínio Quisisana.

Mesmo com a proibição dos jogos de azar em 1946 e a desaceleração da economia em Poços, o processo de verticalização não parou. De acordo com o jornalista Roberto Tereziano, em “Verticalização e o futuro de Poços”, logo vieram outros prédios altos: Emisa, Hércules, Poços de Caldas, Nossa Senhora Aparecida, Ouro Branco… Mesmo assim, segundo ele, “podia-se contar poucas dezenas de prédios altos na área central até os anos de 1980”.

E o que vemos hoje é a investida máxima das construtoras em grandes edifícios que não mais se restringem ao cento da cidade. Incluem-se aí grandes construções populares, como é o caso dos conjuntos habitacionais.

Percebemos, portanto, grandes dualidades na construção das cidades. Uma delas é densidade versus altura.  Densidade diz respeito à concentração de coisas e pessoas e está diretamente ligada à forma com que o espaço é sentido e vivenciado. Porém, remete a maiores alturas de prédios, que permitem mais pessoas por quilômetro quadrado.

Por outro lado, estudiosos defendem que cidades mais compactas, com densidades mais altas, são mais baratas, enquanto que cidades dispersas custam mais à economia do município, uma vez que há maiores distâncias a serem percorridas, necessidade de mais quilômetros de infraestrutura, saneamento, iluminação, etc.

Mas em qual medida a cidade deveria crescer para o alto? Qual o limite da densidade? Para responder, é preciso considerar fatores como o valor do patrimônio histórico, amplo número de pessoas, carros e congestionamentos, perda da privacidade e, principalmente, da luz do sol.  Enquanto isso, a maioria das pessoas tende a buscar locais em que possam ver mais horizontes e menos paredes.

*Bárbara Salomão é jornalista formada pela Universidade Católica de Santos. Atua com assessoria de comunicação e fotografia. É pós-graduada em Jornalismo Digital e em Imagem: processos, gestão e cultura contemporânea. Atualmente integra o conselho curador do Museu Histórico e Geográfico de Poços de Caldas.