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Quem tem direito à creche?

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A associação entre a inserção dos bebês e crianças pequenas na Educação formal, oficialmente Educação Infantil, mas que ainda não desaprendemos a chamar de creches, e a permanência das mães no mercado de trabalho, é algo tão enraizado na sociedade brasileira, que não é raro que se lote a Secretaria de Educação e a Sede do Conselho Tutelar com o argumento de que as crianças cujas mães trabalham devem ter prioridade.

Analisando do ponto de vista do mercado de trabalho e das mães trabalhadoras, e talvez até nosso histórico de Educação Infantil, a fala teria todo sentido. Afinal, temos um mercado que absorveu e explora as mulheres, que ainda são responsáveis pelos filhos e pela casa, e estas não têm com quem deixar suas crianças nesse cenário de trabalho árduo em que vivemos.

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No entanto, analisar Educação é sempre olhar para quem é educado. Educação Infantil é o nome que se dá à educação formal de crianças de zero a quatro anos e não é exagero algum afirmar que esta etapa da educação é a mais importante do ponto de vista do desenvolvimento básico de qualquer criança. E o que prevê a legislação brasileira? Que o Estado ofereça, sob responsabilidade dos municípios, Educação Infantil para crianças nessa faixa etária. Educação Infantil para TODAS as crianças de zero a quatro anos que os responsáveis desejarem inserir na Educação formal, já que não há obrigatoriedade de freqüência nessa idade, mas há direito.

Afirmar a garantia ou prioridade de creches somente para crianças de mães que trabalham é extremamente problemático sob vários aspectos. O primeiro já foi dito, a responsabilidade é do Estado e ele deve arcar com tal. Precisa haver cobrança sobre os municípios. Se faltam creches, cabe à comunidade exigir esse direito no âmbito executivo municipal. Selecionar quem entra ou não entra de acordo com inserção da mãe no trabalho é relaxar uma obrigação do Estado e relativizar o direito da criança. A Educação Infantil é para a criança!!!! E não para a mãe da criança, o pai da criança ou quem cuida da criança.

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Sendo a Educação Infantil um direito da criança, de todas elas, a problemática maior ligada à relativização deste direito é que tratamos desta etapa da educação como se as creches fossem depósitos de crianças. Um local onde deixo meu filho para ir trabalhar e volto à tarde para retirar o pacote. Não importa se está super lotada, não importa se a violação maior é extrapolar e muito os limites das educadoras (que são basicamente mulheres), se a estrutura física não comporta. O que importa é “abrir vagas”. E a política partidária já se apropriou da Educação Infantil utilizando-se deste discurso populista e violador de direitos, porque é isso que ele é. Quem não ouviu candidatos a cargos públicos prometendo creches aos finais de semana e por até 14 horas diárias, sem férias? De que tipo de Educação estamos falando e que sociedade nós queremos enfiando as crianças desde o berço em uma Instituição por este tempo de suas vidas? Qual o resultado disso em termos pedagógicos e emocionais, por melhor que seja a qualidade da Educação Infantil, o que está longe de ser regra no país?

Precisamos atentar ainda para o discurso de função social de gênero implícita nesta questão. Se a realidade é a de que as mulheres são responsáveis na prática pelos filhos, a exigência de que elas estejam trabalhando para que os filhos tenham direito à creche, determina o papel de responsabilidade exclusiva da mulher. Por que não cobramos creche para os filhos dos pais trabalhadores? Porque pais não cuidam dos filhos neste país como regra geral e, embora pareça apoiar as mulheres, essa é uma fala que oprime. Se todas as crianças têm direito à creche por lei, todas as mulheres e homens que têm filhos têm o direito de que as crianças frequentem esta etapa da Educação Formal e não importa o que façam durante seus dias. Pode ser utópico, mas é o que está previsto e precisa ser colocado em prática. Se é uma mãe trabalhadora, que seu filho esteja inserido na Educação Infantil e se é uma mãe estudante também e se é uma mãe adolescente, ainda assim. E ainda que seja uma mãe que nem detenha a guarda da criança, da mesma forma. E se é uma mãe que fica em casa o dia todo, a criança continua tendo direito à creche.

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Por fim, precisamos com urgência entender que Educação Infantil não é guardadora de bebês. Não se coloca criança na creche como quem contrata uma babá! Quando matriculamos uma criança pequena na escola, a finalidade é que ela esteja inserida na Educação Formal. O que quero dizer com isso é que a criança é responsabilidade primária da família e não da escola. Há dias em que não há aula, há dias em que há reunião, outros em que a caixa de água não encheu, a comida não chegou, seu filho passou mal e são os pais ou responsáveis legais que têm obrigação de ter com quem deixar os filhos. E não estou aqui defendendo alguma argumentação moral de planejamento familiar, no entanto, estamos em uma situação em que simplesmente muitas famílias não se responsabilizam mesmo pelos filhos, entrando em um processo de terceirização da educação e cuidados do qual a Escola jamais dará conta e que não é seu papel.

Há tempos convivo com um texto que aborde os motivos da Educação Infantil, a beleza da escola e da pedagogia nessa fase do desenvolvimento e a injustiça que a visão de que a creche serve para “deixar crianças” causa no cenário da Educação formal para crianças pequenas. Por ora, creio que nos baste pensar nas crianças, seres em desenvolvimento pleno, descoberta do mundo todo, dos corpos, da vida, das sensações, dos afetos e no que estamos pensando quando as inserimos na Educação. Se a creche continua nos servindo de imaginário auxiliar para a exploração capitalista das mulheres, é bem certo que guardar bebês, alinhar os berços, trocar fraldas em série também nos sirva como item de utilidade prática, mas nunca nos servirá como caráter de desenvolvimento humano ou de construção de uma sociedade melhor.

* Andréa Benetti é pedagoga, formada na Puc Minas pelo ProUni, e conselheira tutelar em Poços de Caldas, regiões sul/oeste.

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