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E afinal, o que é ser mulher?

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Após todas as aclamações ao feminino, ao belo, às rosas e suas recusas no dia oito de março, resta o questionamento do que tem significado ser mulher. Ser mulher certamente não possui um significado estático, atemporal, muito menos desprovido da cultura em que estamos inseridos. No entanto, algumas semelhanças se mantém historicamente sobre o conceito do que consideramos como mulher, feminino, fêmeas ou qualquer outra denominação que resolvemos ceder ao que hoje nos é tão possível debater quando falamos em gênero.

Gênero não é um conceito qualquer, utilizado para definir binários femininos e masculinos, é um conceito que insere, que discute e que nos permitiu e permite, agora mais do que nunca, conceber a mulher enquanto categoria de análise histórica. Gênero é o que nos permite, inclusive, discutir se existe homem e mulher e o que nos faz divididos universalmente em duas categorias que nos aparecem como opostas. Falar em gênero é desnaturalizar os conceitos, é ver a cultura na construção de questões que antes nos apareciam como dadas e meramente biológicas. Prontas. Acabadas.

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Quando, ainda em meados do século passado, Simone de Beauvoir discutia sobre a feminilidade, questionava se estaria ela debaixo das saias rouge-rouge ou se seria excretada secretamente pelos ovários, perguntava-se o que seria uma mulher, o que fazia de nós, mulheres? Ter filhos? Ter útero? Relacionar-se com homens? Usar saia? Maquiagem? Ou estar fadada a determinadas funções sociais que não se poderia jamais negar, já que o corpo era o destino? Beauvoir recusou a noção biologicista de mulher lançando que “Não se nasce mulher, mas torna-se uma”. Nos tornam mulheres, nos tornamos mulheres, em uma dada cultura, em um determinado tempo, dentro das diferenças específicas desse tempo e cultura, mas há algo que não se abandonou por milênios: ser mulher é uma categoria que envolve opressão social, dominação e subordinação sexual.

E como sei que, a essa altura do texto, já estão me acusando de desconsiderar que pessoas nascem com vaginas e outras com pênis, antes que me digam que ser mulher não é apenas “se vestir como uma”, lanço logo a questão de que ser mulher ou homem tem menos, muito pouco ou nada a ver com órgão sexual e muito mais com a construção social a partir dessa diferenciação biológica, que existe e é óbvia.

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Ser mulher ou homem envolve pressupostos sociais tão arraigados em nossa sociedade que materializamos o gênero ao corpo, mas ele é construído. Quando nos chocamos com alguém e não conseguimos identificar seu gênero e o sexo, quando nos é impossível saber se essa pessoa se encaixa em categorias de homem ou mulher, nesse momento, a realidade do gênero é colocada em dúvida. Esse fato nos remete ao ponto do incômodo com o não-binário. Quando a travesti é violentada porque seu lugar social não existe, ela não cabe em categorias de encaixe binários de gênero. As pessoas não podem admitir que tal mulher seja mulher. Seu lugar então é a marginalização, é onde estão os que não podem existir. Os abjetos.

É pensando nessas abjeções e na ausência de lugar social a que estão destinadas as travestis, transexuais ou qualquer outra pessoas que não se encaixe mais ou menos dentro das gavetinhas que a elas destinamos, desde antes de nascer e é também pensando que a abjeção nos cabe enquanto mulheres, todas nós, transexuais ou não, durante a maior parte de nossas vidas, que mesmo entendendo que o gênero é construído socialmente, não abrimos mão da categoria “mulher”.

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É por imperativo de militância e não por determinismo biológico, de políticas públicas ou religiosas que ainda permanecemos concebendo esta categoria, que não é ilusória, apesar de socialmente, construída, ela existe, é real, mas não é natural, permanente, estática, muito menos imutável.

Ser mulher hoje, rebater as fragilidades que nos são impostas, às violências múltiplas a que somos submetidas cotidianamente, às triplas jornadas, significa permanentemente também recusar o que nos impõe como sendo “de mulher”. É a cerveja “pra macho”, afinal puro malte não nos pertence, é a obrigatoriedade da maternidade, a impossibilidade de sua recusa, a romantização do sexo e do ciúme, a imposição do recato. A busca do príncipe. A obrigação de ser feminina, de não ser homem, de não agir como tal. E é, principalmente, o rebate à aceitação da violência. Violência aceita, não é somente a violência física engolida, é também e principalmente, o grande discurso social de aceitação, conformidade e desejo por essa tal feminilidade, que nos diferencia oprimindo, que nos condiciona e subtrai sempre. Violência é a de não poder recusar-se mulher, não se permitir ser outra mulher que não essa mulher social já tão desgastada.

* Andréa Benetti é pedagoga, formada na Puc Minas pelo ProUni, e conselheira tutelar em Pocos de Caldas, regiões sul/oeste.

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