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Natal – Festa das Luzes!

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andrea-benettiDe muitas formas a humanidade se relaciona com a ideia das luzes e da escuridão como simbologia que remete ao esclarecimento, à vida e à liberdade. No Mito da Caverna, de Platão, o acorrentado só pode ver as sombras refletidas por uma fogueira, sem entender que o que conseguem visualizar é provocado por eles próprios, como um teatro na parede! O cativo que tem a coragem de sair, deslumbrando com a luz e com tudo o que há lá fora, o filósofo é considerado louco e acaba assassinado quando volta para contar aos outros o que é o mundo!

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Chamamos de Idade das Luzes ou Iluminismo a fase de ascensão de uma ciência que se pretende racional e da busca do desprendimento do pensamento cerceado pela teocracia. Dizemos que a mulher “deu à luz” quando nasce um bebê, e também nomeamos de “renascimento cultural” o retorno aos questionamentos existenciais e às expressões artísticas que se buscavam libertas, em um modelo que se pretendia laico.

Dia 25 de dezembro a sociedade cristã ocidental comemora o Natal, como nascimento do menino Jesus. A virgem pobre que deu à luz em uma estrebaria, longe de sua cidade de origem, ao menino que seria então a salvação do povo judeu. Curiosamente, a data foi escolhida porque se comemorava a festa pagã do Solstício de Inverno. Algumas denominações cristãs da atualidade, inclusive, se recusam a comemorar o dia 25 como o verdadeiro Natal por este mesmo motivo.

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Nesta jornada da humanidade de anseio e receio pela luz, já que alternamos simbologia com história, me surpreendo pensando na iluminação artificial, tão recentemente criada pelo homem e já irremediavelmente presente em nossos dias. E noites. A partir do desenvolvimento da luz elétrica a sociedade passou por uma verdadeira revolução, marcada especialmente pela possibilidade de executar atividades noturnas, o que nos caracteriza hoje como uma sociedade de gente que não para. Se a luz artificial nos deu a possibilidade do banho quentinho e do jantar a qualquer hora com a família, também nos deu o microondas e a solidão do prato pronto. Se, por um lado, a academia fica aberta até a madrugada, nosso expediente de trabalho se estende para muito além do pôr-do-sol. E é em todos os natais que podemos ver, é só olhar por trás do balcão, que além dos shoppings lindamente iluminados com as árvores e luzes, estão os vendedores que trabalham por até 14 horas e chegam mesmo a virar a madrugada do dia 23, para garantir o atendimento cômodo à família. Família que não é a sua.

Por isso, falar em Natal não é clichê, é sempre falar em exclusão. Falar em cidades lindamente iluminadas, me faz lembrar a música do Chico, contando do trabalhador que constrói a escola em que sua filha jamais entrará. Nós pensamos na ceia que vemos na TV, sem saber que a realidade da maioria dos brasileiros não é aquela. Se a lógica por trás do Iluminismo, embora de liberdade, era a dos ideais burgueses, essa trajetória não nos abandonou. Afinal, construímos os padrões natalinos, pascoalinos etc, dentro de modelos de família, classe e gênero que nem todos iremos atender. O que chamamos de liberdade, na verdade, é também o que nos impede de ver o céu.

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Recentemente ouvi em um documentário que os astrônomos não conseguem mais observar o céu e as estrelas noturnas nos grandes centros e têm construído seus observatórios nos desertos porque tem sido impossível se livrar das luzes artificiais. Assim, algumas cidades dos Estados Unidos já buscam regulamentar e restringir o excesso de luzes artificiais, que ajudam a construir o que chamam de poluição visual. A poluição visual não é mais entendida somente como o excesso de letreiros, faixas, sujeiras e pichações em muros, mas também no excesso de iluminação.

Somos impedidos de ver o céu como ele é! As luzes artificiais estão tão entranhadas em nossas cidades que não vemos mais as luzes naturais, as estrelas, asteroides nem pensar! Precisamos da luz, mas também precisamos da escuridão! Estamos doentes porque nosso céu está escondido!

Há pouco tempo fui acometida por uma doença muito comum em nossos tempos, a labirintite, a verdadeira alergia à luz artificial. Eu olhava para a luz e sentia dor. E me deitava logo no quarto escuro para aliviar a dor. E era dopada de remédios para não sentir a tontura diante da luz infernal do computador. Meu cérebro fazia o que tinha que fazer: reagia à quantidade de luz e à movimentação excessiva dos meus olhos, que pulavam involuntariamente diante do excesso de estímulos a que eu os submeti por mais de 20 anos. E me obrigou a parar. Ou você para ou não fica em pé. E foi só assim, doente do labirinto desregulado que eu passei a sentir a necessidade do escuro, do silêncio, de sentir o frio da noite e perceber que nós estamos nos desligando de nossa própria natureza. Nós somos parte do cosmos que não conseguimos mais ver! Construímos as cidades com nossas luzes maravilhosas, mas não consideramos que também precisamos da escuridão para ver as luzes naturais.

E é assim também que temos construído nosso Natal: a grandeza das nossas árvores coloridas tem escondido as desigualdades sociais que nos constituem, os comerciais de TV com seus perus de termômetros saltitantes têm nos feito desconsiderar que há crianças passando fome, apesar do tal espírito natalino que nunca ultrapassa o voluntarismo e a esmola. O Natal precisa ser reconstrução! O Natal precisa ser o retorno às luzes naturais que, impedidas pelas cidades de vida noturna iluminada, ficaram encobertas pelo nosso artificismo social, pela nossa confusão mental coletiva, pela incapacidade que desenvolvemos de lidar com o escuro e entender que ele também é bom. Que a luz só existe porque há também noite!

E o que eu nos desejo neste Natal é que sejamos uma sociedade que deixe de assassinar os corajosos que saíram da caverna para vislumbrar a luz natural e que, ainda assim, voltaram para nos contar que há mais! Que há luz nos céus oculta pelos nossos prédios, que há vida além dos shoppings natalinos da iluminação de artificial! Que aquela iluminação foi colocada ali, provavelmente, por quem não pode vivenciar o natal da TV! Que eu, você e todos somos parte do céu que não podemos mais ver e que nenhuma outra luz pode ser mais bonita do que a das estrelas que estamos ocultando porque olhar para o céu é olhar para a história da humanidade, é entender das marés, das plantas, dos animais e dos ciclos de fertilidade.

Olhar para o céu é olhar para o passado e pensar em nossa própria finitude, é saber que há ali estrelas que já se apagaram, mas que suas luzes ainda chegam até nós, é entender de nossa limitação humana e de nosso fim inegociável, além de toda soberba e grandeza de qualquer construção da iluminação artificial humana. Olhar para o céu é entender da nossa responsabilidade de (re)construir uma sociedade justa e um mundo sustentável para todos, para quem sabe, quando nos formos, nossa luz continuar a brilhar, assim como a das estrelas, aquelas que não somos mais capazes de ver…

* Andréa Benetti é pedagoga, formada na Puc Minas pelo ProUni, e conselheira tutelar em Pocos de Caldas, regiões sul/oeste.

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