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Poços de Caldas

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Turismo, mobilidade urbana e ingratidão

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Rubens Caruso é o fundados do movimento 'Poços na LInha'
Rubens Caruso é fundador do movimento ‘Poços na Linha’.

O jornalista e empresário Rubens Caruso nos recebe com café e muito embasamento. Em cima da mesa, duas caixas de documentos referentes aos quatro anos do movimento Poços na Linha, que luta pela conservação do patrimônio ferroviário e implantação do trem turístico.

Caruso lembra que há um movimento contrário ao trem, mas defende o projeto com argumentos concretos. Para ele, essa é uma forma de estimular o turismo e de criar novos, e sustentáveis, caminhos para a mobilidade urbana.

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Poços Já: Já existe um estudo de viabilidade técnica. Como foi esse processo?

Rubens Caruso: É um extenso trabalho, em que os autores, que são ligados à ABPF (Associação Brasileira de Preservação Ferroviária), fizeram metro a metro. Eles partiram lá da estação e foram fazendo tudo, com indicação de posicionamento via satélite, e chega até a parte em que eles apresentam o equipamento que tem disponível para a gente lá. Já tem a locomotiva, que está em restauração, tem tudo. Esse trabalho custou R$30 mil, investimento que viabiliza a cidade ir à CODEMIG e mostrar que tem um projeto que dimensiona toda a necessidade de custo, o que precisa de trilho, o que precisa de dormente, e esse trabalho ensejou a licitação para contratação do projeto executivo básico. Tem aqui o que precisa ser feito, qual o material que vai empregar, tudo. Nós nunca estivemos tão perto como agora.

Poços Já: Esses dez milhões são suficientes?

Rubens Caruso: Esse é outro negócio que deu bastante buchicho: dez milhões da Codemig e dois milhões de contrapartida da prefeitura. No próprio convenio está muito claro isso: “A contrapartida oferecida pela prefeitura será atendida por meio de recursos não financeiros. Consistem de serviços de administração, topografia, que já está feita, projeto básico, que é esse edital que vai contratar, recuperação de encostas, limpeza e drenagem”. Não estamos tirando dinheiro de outra fonte da cidade. A gente sempre teve em mente, e no fim deu mais ou menos isso, o custo de construção da ferrovia de um milhão por quilômetro. Cada quilômetro são 1.600 dormentes mais o trilho, mais o cascalho, a mão de obra. O custo é esse mesmo, tem tudo para fazer. Não faz se faltar vontade política agora. De qualquer lado.

Poços Já: E quando chega esse recurso?

Rubens Caruso: Já era para estar vindo. Um pouco antes da eleição a gente ouviu que a prefeitura tem obrigação, para poder receber o recurso, de apresentar certidão negativa de débito. Pelo que a gente viu, tem débito com o INSS. O prefeito falou que estão trabalhando para regularizar isso. Pagando a primeira, some a pendência. Da parte do Sérgio, o plano de governo dele contempla dar continuidade ao projeto do trem com uma condicionante: desde que o governo do estado efetivamente viabilize os recursos.

Poços Já: O trem turístico vai impedir a construção de uma via estrutural, esse é um dos argumentos contrários ao projeto.

Rubens Caruso: No meu modesto entendimento a prefeitura, quando fez o Plano Diretor de 2004 e colocou como diretriz essa via estrutural usando o leito da ferrovia, cometeu uma inconstitucionalidade. Eu consultei juristas, e a opinião foi exatamente essa. A prefeitura não pode legislar sobre um bem de um ente superior. Você tem como exemplo a rua Beira Linha, que até hoje é um espaço de cidadãos maltratados, e a prefeitura não pode fazer nada, não pode passar asfalto, porque é da União. Agora com a concessão muda um pouco isso, mas existiu essa discussão.

Poços Já: E tem o cruzamento com a avenida da PUC também.

Rubens Caruso: A ABPF tem muito know-how nisso, porque eles operam um trem em Jaguariúna (SP), que anda boa parte paralelo com uma avenida. O trem turístico não é um negócio que vai circular de meia em meia em meia hora. Tem um cruzamento ali, mas não tem problema de segurança porque é tudo sinalizado, abalizado, tem um cara que fecha e abre. É tranquilo. Outra discussão que tem é que essa avenida estrutural desafogaria todo o trânsito da João Pinheiro rumo ao Centro. Eu não sou especialista no assunto também, mas eu entendo que o problema do trânsito no Centro é muito mais de gestão do que de abrir avenida nova. Tem um estudo interessante, de urbanistas, explicando por que não adianta abrir mais avenidas. Você vai aumentando o volume de carro, e quanto mais carro indo para o Centro mais vai dar problema. O último grande movimento que teve foi a Zona Azul nova, mas você não vê mudar mão de avenida, surgir um calçadão no Centro, uma área para pedestres, nada. Não consigo enxergar o trem prejudicando o trânsito da cidade. Vamos discutir o futuro em cima de coisas palpáveis, tem muito achismo na história também.

Caruso começou a se interessar pelas ferrovias por ser bisneto e neto de ferroviários.
Caruso começou a se interessar pelas ferrovias por ser bisneto e neto de ferroviários.

Poços Já: Por que você começou a se interessar pelo trem turístico?

Rubens Caruso: Eu sou bisneto e neto de ferroviários. Meu bisavô veio da Itália para o Brasil, analfabeto, e se tornou trabalhador braçal da ferrovia. Mais tarde, o filho dele foi ferroviário também e fez uma carreira um pouco mais bacana, foi telegrafista. Se aposentou novo, porque começou a trabalhar com nove anos. É bem genético, o trem está no sangue da gente.

Poços Já: E como foi o início do Poços na Linha?

Rubens Caruso: Já tinha começado uma discussão sobre a preservação do patrimônio ferroviário por causa dos pilares que tem ali perto da PUC, naquele vale do Novo Mundo, datados de 1886, da inauguração da estação. Um dia eu fui fazer uma apresentação sobre patrimônio ferroviário na Criativa Idade e fizemos um negócio grande, com 40, 50 alunos, um debate muito bom. No meio dessa discussão, uma garotinha se levantou, pediu a palavra, e disse: “Vamos fazer um abaixo assinado para o prefeito”. E aí começou. Dali a gente fez o perfil no Facebook e chegou onde chegou, mas a origem mesmo é com a comunidade escolar.

Poços Já: Agora vocês estão no auge desse processo?

Rubens Caruso: Cara, não tem fim. Ainda que a gente não consiga viabilizar a volta do trem, a gente precisa continuar lutando pelo patrimônio ferroviário, porque tem muito da história da cidade envolvida.

Poços Já: Quais são as questões que envolvem patrimônio?

Rubens Caruso: A estação é um espaço tombado como patrimônio histórico e protegido por lei, mas é um espaço totalmente maltratado. Essa semana eu produzi uma artezinha marota: eu peguei uma foto do saguão das Thermas e coloquei esses enfeites de Natal que estão sendo reformados na estação. Para chocar. A estação virou oficina, virou depósito. Mas eu vejo como patrimônios iguais, patrimônios históricos da mesma importância. Tem um outro fator: tudo que vem depois da ferrovia vem por causa dela. Os lustres do Palace Casino, como chegaram aqui? De trem. A riqueza cultural, os costumes, o pessoal vinha jogar, que era uma desgraça, mas trazia grana para a cidade, trazia recursos.

Poços Já: Podemos dizer que a cidade é ingrata.

Rubens Caruso: A cidade tem sido ingrata em relação à ferrovia, isso é verdade. Bom ponto. Além da estação estar fora do contexto, o locatário, o ocupante, que é a secretaria de turismo, está falhando. Devia estar zelando por aquele patrimônio, mas não está. Tem uma outra coisa muito ruim na estação também, do lado de lá da plataforma tem dois barracos de madeira construídos, com instalação elétrica precária. E no posto, que está abandonado também, está morando mendigo. É a receita tradicional: patrimônio ferroviário e morador de rua é incêndio. Não tem jeito, quantos trens você ouviu falar que pegaram fogo? Faz fogueirinha, dorme e bota fogo.

Poços Já: Como está essa questão nacionalmente?

Rubens Caruso: Existe um movimento nacional pela operação e pela implantação de trens turísticos. Lá em 2012, quando a gente começou a discutir o assunto, o governo federal anunciou a oferta de recursos para a implantação de trens turísticos. Algumas cidades apresentaram o projeto e conseguiram, tem de 30 a 35 trens turísticos operando no Brasil e muita gente trabalhando, fazendo projeto para ter. Mas tem uma premissa fundamental, que até o Ministério do Turismo destaca bastante, que o trem turístico vai funcionar na cidade que já é turística. Nós temos tudo aqui, temos atrativos naturais, atrativos diversos como hotelaria, gastronomia, eventos culturais, festas. Temos uma estrutura turística montada e a ferrovia à disposição para colocar os trilhos.

Poços Já: O prefeito Eloísio apoiou o Poços na Linha?

Rubens Caruso: De janeiro de 2013 para cá ele fez acontecer muita coisa, temos que fazer justiça. Contratou o estudo de viabilidade técnica, foi lá em Jaguariúna (SP), durante um seminário nacional de trens turísticos, conseguiu a concessão, o convênio com a CODEMIG. Mas a burocracia é muito mais lenta do que a nossa ansiedade.

Caruso mostrou ao Poços Já o estudo de viabilidade técnica do trem turístico.
Caruso mostrou ao Poços Já o estudo de viabilidade técnica do trem turístico.

Poços Já: O trem vai ser bitola métrica, mantendo o que era?

Rubens Caruso: Vai ser bitola métrica, mas no futuro você pode estender mais uma linha.

Poços Já: Aí o trem pode ser usado de outra forma.

Rubens Caruso: O ramal da ferrovia vem lá do Centro, para na Estação Bauxita e segue para São Paulo. Uns 500 metros para trás tem um desvio à esquerda no antigo ramal da Alcoa.

Poços Já: Que passa por baixo da Rodovia do Contorno.

Rubens Caruso: Isso. Esse ramal, se você desviar para frente da Alcoa, coloca o trem na Zona Sul. E aí você tem a possibilidade de ter um VLT ligando o Centro à Zona Sul. Detalhe: essa discussão estava no Plano Diretor de 1994. Na revisão de 2004 o negócio sumiu. E com um outro agravante: a ferrovia em Poços é simples, para um trem, é estreita. Em boa parte desse traçado não cabe uma avenida estrutural. É transporte coletivo sustentável, porque é elétrico.

Poços Já: No estudo de viabilidade técnica já tem os vagões, de primeira e segunda classe.

Rubens Caruso: Primeira, segunda, misto.  O estudo contempla, por exemplo, o valor do bilhete. A passagem em 2014 estava estimada em oito reais. Tem uma questão social importante que eles consideraram: as crianças das escolas municipais vão ter um dia por semana para fazer um passeio de graça. Quem é de Poços de Caldas vai ter um dia da semana que paga metade da passagem. Tem tudo, acessibilidade para cadeirantes, está tudo previsto.

Poços Já: De onde vem esse movimento contrário?

Rubens Caruso: A avenida é um fator importante na questão imobiliária. Imagina que você tem um bom terreno para fazer um loteamento num lugar com acesso ruim e de repente você passa uma avenida ali. Valoriza muito. Pode ser especulação imobiliária, pode ser gente que acha que o trem é um transtorno para o trânsito. Tem muito mais gente pensando em si próprio do que no coletivo. Se alguém estivesse pensando no coletivo estaria discutindo mobilidade urbana avançada, além do ônibus. E essa discussão você não vê.

Poços Já: E tem muito do senso comum também, de falta de informação. São aquelas pessoas que vão no Facebook e comentam “Mas e a Santa Casa?”

Rubens Caruso: Em momento algum nós empurramos essa conta para a prefeitura. Não seria eu a sugerir tirar dinheiro da saúde para outra coisa. Tem prioridades? Tem prioridades. O Sérgio tocou nesse assunto, assim que começou a dar entrevistas ele falava: “Nós temos que ver se o projeto do trem é uma prioridade”. Não mistura as coisas, a gente sempre teve cuidado. Esse cuidado se revelou na questão da contrapartida.

Poços Já: O que te motiva a lutar tanto pelo trem turístico?

Rubens Caruso: Pois é, outro dia o sr. Odair (Camilo, do jornal Brand News) fez essa mesma pergunta: por que essa fixação? Não é uma fixação, é uma obsessão. Muito pior. Além da questão genética, da história da família, eu enxergo que para a cidade é um baita projeto. Você movimenta o turismo, traz gente nova, é mais uma coisa para os turistas gastarem dinheiro na cidade. Isso vira imposto, vira emprego, vira consumo. Isso tudo tem valor muito grande para a cidade. É um pouco de idealismo? É um pouco de idealismo. Some-se a isso a minha incrível persistência calabresa. Já fui acusado algumas vezes de estar tendo algum ganho pessoal e eu desafiei na mesma moeda, disse: “Então, por favor, demonstre qual é”. Eu tive o cuidado de não me associar à ABPF, se eu me associar tenho desconto para andar em qualquer trem do Brasil. Até nisso eu tive cuidado, para não dizerem “mas você é associado à ABPF”. Eu não tenho nenhum ganho pessoal. É uma satisfação, possibilidade de trabalhar em algo bacana pela cidade, além do que a gente já faz.



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